Por Harald Welzer*
Nossa memória não distingue as lembranças “verdadeiras” das “falsas”. Para o indivíduo, é razoável que seja assim, já que a memória nos orienta no presente – por exemplo, na tomada de uma decisão baseada na experiência.
Em se tratando, porém, de uma lembrança importada (ou seja, provinda de fonte estranha), mas capaz de ensejar uma intuição correta na tomada de decisões, essa indistinção é de maior serventia ao indivíduo do que seria tomar uma decisão errada com base numa lembrança “verdadeira”.
Melhor é que nos acostumemos com a idéia de que a memória tem menos a ver com o passado do que muitos acreditam. O propósito a que serve é, que muitos pesquisadores encontram a explicação para o fato de as funções de a memória terem, no curso da evolução, se aperfeiçoado cada vez mais. O psicólogo e neuro-cientista cognitivo Merlin Donald, da Universidade Queen’s, Canadá, descreve esse processo em seu livro A mind so rare, em que reconstrói o desenvolvimento da nossa consciência.
A memória de esconderijos de alimentos, companheiros de espécie inamistosos ou inimigos naturais não serve aos primatas (gorilas, por exemplo) para lembrá-los de “como as coisas eram no passado”, mas para capacitá-los a avaliar o ambiente de forma otimizada em relação a seus propósitos. Ocorre o mesmo com a memória humana, que apresentou, porém, nítida expansão em relação à dos primatas não humanos. A memória autobiográfica - característica própria e exclusiva do homem - trabalha de forma “autonoética”, ou seja: não temos apenas a capacidade de nos lembrar, mas também a consciência de que nos lembramos. Esse poder oferece a vantagem inestimável da evocação consciente e explícita de lembranças. Podemos, portanto, tornar a nos colocar voluntariamente em situações passadas e assim, por exemplo, rememorar uma ação e as alternativas a ela não percebidas na época, a fim de, numa situação presente, poder tomar a melhor decisão.
Do ponto de vista evolutivo, uma memória autobiográfica possui, portanto uma enorme vantagem no que se refere a nossa adaptabilidade, uma vez que se torna mais eficiente nossa capacidade de lembrar. Com isso percebemos a nós mesmos num continuum espaço-temporal que nos permite, de modo planejado, explorar nosso ambiente. Isso nos dá também a possibilidade de protelar, isto é esperar por oportunidade melhor para superar situações problemáticas, encontrar com calma soluções mais eficazes. Em suma, permite-nos a ação baseada na escolha e no momento oportuno.
Também isso mostra que a memória está menos relacionada ao passado do que ao presente. Como todos os demais sistemas de memória, a memória autobiográfica visa o trato como presente. Há assim um mal-entendido na base da indignação motivada pelo fato de as pessoas muitas vezes não se lembrarem “corretamente” das coisas: o de que história e memória estariam diretamente ligadas. Não é bem assim.
A memória é oportunista: acolhe o que lhe serve e descarta o que lhe parece supérfluo ou desagradável.
Gostei muito desse seu último texto!Realmente bom!E concordo que a memória nossa só guarde o que lhe é conveniente,bem a minha,pelo menos é assim...rsrsrs Ah,e obrigada pela visita ao ''La vie en rose''! Volte sempre que desejar! =)
ResponderExcluirOi, obrigada pela visita ao IP. Se olhar nos arquivos do blog vai encontrar muitas histórias de Nasrudin; um abraço.
ResponderExcluirAinda bem que "a memória é oportunista: acolhe o que lhe serve e descarta o que lhe parece supérfluo ou desagradável", pois lembranças ruins temos mesmo que descartar!
ResponderExcluir=)
Beijo
Voltei! Eu não sei mexer com templates ou criar, como sugeriu, arquivos por assuntos. Mas separei dois links com várias histórias do Mulá, pra você dar uma olhada. São eles: http://www.sertaodoperi.com.br/poesiasufi/nasrudin/indice.htm e http://www.cuidardoser.com.br/coletanea-nasrudin.asp
ResponderExcluirA minha memoria anda me pregando peças, tenho esquecido muitas coisas ultimamente hehehe
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